Desconstituição automática da coisa julgada em matéria tributária: os impactos de um dos julgamentos mais esperados em 2023

Os Temas 881 e 885 do STF podem ser julgados ainda este ano, trazendo graves consequências ao contribuinte caso prevaleça o entendimento pela quebra automática das decisões definitivas

Por Pedro Augusto — , 07 de January de 2023
Em: STF

O debate no julgamento dos Recursos Extraordinários nº 949.297 (Tema 881) e nº 955.227 (Tema 885) no STF gira em torno da possibilidade de a coisa julgada em relações tributárias de trato continuado ter seus efeitos automaticamente cessados mediante decisão posterior da própria Corte, seja em sede de controle concentrado ou repercussão geral.

O julgamento põe em risco tanto os contribuintes com ação tributária em andamento, quanto aqueles com decisão favorável transitada em julgado, tendo em vista a possibilidade de quebra automática das decisões definitivas que não podem mais ser objeto de recurso.

Sobre os casos

Mais detalhadamente, o RE 949.297, de relatoria do ministro Edson Fachin, tem como objeto os efeitos da decisão do STF que declara constitucional a exigibilidade de determinado tributo, em sede de controle concentrado, sobre a coisa julgada anteriormente formada em favor do contribuinte no sentido da inexigibilidade desse mesmo tributo.

Por sua vez, o objeto do RE 955.227, de relatoria do ministro Roberto Barroso, são os impactos futuros provocados sobre a coisa julgada que envolve a tributação em relações continuadas, caso haja posterior modificação de entendimento pelo STF em julgamento de controle difuso.

Julgamento

Em sede de julgamento conjunto dos Recursos em Plenário Virtual, após pedido de vista, o ministro Gilmar Mendes mudou seu voto para acompanhar as teses dos relatores, formando então maioria pela perda da eficácia das decisões transitadas em julgado que declaram a inexistência de relação jurídico-tributária, em razão de superveniente declaração de constitucionalidade da norma pela Corte.

Em outras palavras, as referidas teses estabelecem que as decisões do STF em matéria tributária, seja em controle concentrado ou difuso, cessam automaticamente a eficácia de decisões interpartes anteriores já transitadas em julgado, diante da alteração na situação de fato ou de direito que sustentava tais decisões.

O ministro Gilmar Mendes, que antes da alteração de seu voto divergia dos relatores em diversos pontos, passou a divergir apenas no que diz respeito à aplicação da tese a partir da publicação da ata de julgamento e à observância do período de anterioridade nonagesimal, para os casos de contribuições sociais, e de anterioridade anual e noventena, para as demais espécies tributárias, entendendo não haver a necessidade de aplicação dos princípios.

Além do ministro Gilmar Mendes, já haviam votado favoravelmente à União, no Tema 881, os ministros Rosa Weber, Alexandre de Morais e Cármen Lúcia, que seguiram o relator, e os ministros Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli, que votaram com ressalvas, propondo tese relativamente diversa.

Já no tema 885, acompanharam integralmente o relator os ministros Rosa Weber, Dias Toffoli e Alexandre de Moraes, tendo Gilmar Mendes apresentado as ressalvas mencionadas anteriormente.

Repercussão

Apesar de uma maioria ter sido formada com o voto-vista do ministro Gilmar Mendes, o pedido de destaque do ministro Edson Fachin retirou os processos do Plenário Virtual para que o julgamento seja reiniciado presencialmente, anulando todos os votos até então proferidos.

Caso tais votos se repitam no julgamento presencial supramencionado, a garantia constitucional que impossibilita a rediscussão e eventual modificação de decisões de mérito transitadas em julgado será comprometida, expondo o contribuinte a arbitrariedades na atividade arrecadatória do Estado.

Ainda, caso prevaleça a tese de flexibilização da coisa julgada, a atribuição de eficácia autoritativa às decisões do STF, sob o subterfúgio da uniformização jurisprudencial, afrontará o próprio controle difuso de constitucionalidade, bem como limitará os graus inferiores de jurisdição a apenas reproduzirem as decisões da Corte.

Neste sentido, cabe ressaltar que a abertura de um precedente como este causará enorme insegurança a todos os componentes de relações jurídicas em geral, onde já transitaram em julgado as decisões definitivas proferidas em graus inferiores de jurisdição, cujo tema poderá eventualmente entrar em discussão no STF.

Não bastasse a iminência da flexibilização da coisa julgada, que por si só trará enormes prejuízos ao contribuinte, os votos proferidos em sede de julgamento em Plenário Virtual evidenciam a total inobservância das soluções previstas no ordenamento jurídico brasileiro com o intuito de atender a eventualidade de incoerência entre as decisões do STF e os demais tribunais – a Ação Rescisória e a Ação Revisional -, tendo em vista que a quebra das decisões se daria de forma automática.

Por todos esses aspectos, há grande apreensão acerca do julgamento dos Temas, motivo pelo qual se faz necessário o acompanhamento por um advogado especialista para viabilizar a correta aplicação de eventual novo entendimento jurisprudencial fixado pelo STF.