As subvenções de ICMS e os impactos na tributação de IRPJ/CSLL

O que você precisa saber para economizar, reduzindo a tributação do IRPJ/CSLL com a exclusão das subvenções

Por Germana Cunha — , 06 de April de 2022
Em: IRPJ/CSLL

Como se sabe, os Estados e o Distrito Federal renunciam ao recebimento de parte significativa do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), concedendo incentivos/benefícios fiscais em favor das empresas instaladas em seus territórios, visando atrair investimentos e promover o desenvolvimento social e econômico das suas regiões.

Sobre a classificação das Subvenções

A natureza das mencionadas subvenções suscitou grandes debates ao longo dos anos, já que tal conceito repercutiria diretamente na inclusão ou não dos valores na base de cálculo dos tributos federais. Assim, a interpretação predominante era a de que os benefícios se subdividiam em subvenção para o custeio e subvenção para o investimento.

Por subvenção de custeio compreendia-se as que eram destinadas a compensar despesas operacionais e de manutenção, ao passo que as subvenções de investimento seriam aquelas concedidas a fim de incentivar a implantação ou expansão de empreendimentos econômicos.

Do advento da Lei Complementar nº 160/2017

Contudo, com a promulgação da Lei Complementar 160/17, a divergência de entendimento que existia a respeito da classificação das subvenções estaduais e distritais deixou de existir, já que seu art. 9º, o qual acresceu os parágrafos 4° e 5° ao art. 30 da Lei 12.973/14, determinou que todas as subvenções estaduais e distritais são consideradas subvenções de investimento[1] e podem ser excluídas das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, desde que atendidos determinados requisitos contábeis.

As mudanças dos entendimentos adotados pela Receita Federal

Destaca-se que, após a entrada em vigor do novo regramento, a Receita Federal publicou a Solução de Consulta Cosit 11/2020, dispondo que a partir do advento da LC nº 160/2017, consideram-se como subvenções para investimento os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao ICMS concedidos por Estados e Distrito Federal”.

Em razão disso, muitas empresas passaram a considerar os incentivos fiscais de ICMS como subvenções para investimento, excluindo-os da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Todavia, contrariando seu próprio entendimento, a Receita Federal divulgou a Solução de Consulta Cosit 145/2020, na qual afirmou que, a partir da LC nº 160/2017, os benefícios e incentivos de ICMS serão excluídos do lucro real, desde que cumpridos os requisitos do artigo 30 da Lei nº 12.973, de 2014, dentre os quais, a necessidade de que tenham sido concedidos como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos.

Em outras palavras, o Fisco Federal desconsiderou a qualificação dos benefícios fiscais de ICMS como subvenção para investimento por imposição legal, restabelecendo a barreira existente antes da vigência do aludido § 4º do art. 30, da Lei 12.973/2014, tornando-o absolutamente inócuo.

Do entendimento adotado pelo CARF

Contudo, há que se realçar que a Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF  diverge do entendimento da RFB e entende que o artigo mencionado não fixa  “a necessidade de que tenham sido concedidos como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos” como requisito para a exclusão dos benefícios de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.  O único requisito se refere à forma de contabilização, como já adiantado anteriormente.

Assim, nos termos da decisão, a caracterização como subvenção para investimento dependeria somente de sua devida escrituração em conta de Reserva de Lucros, podendo ser utilizada para a absorção de prejuízos ou para o aumento do capital social, sendo vedada sua distribuição em favor dos sócios, direta ou indiretamente, por outras manobras societárias.[2]

Portanto, independentemente da denominação, o contribuinte que tenha benefício fiscal de ICMS e cumpra os requisitos de contabilização delineados acima, poderá excluir a subvenção da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, nos termos do entendimento da Câmara Superior.

A jurisprudência acerca da matéria

Por outro lado, há que enfatizar que a referida matéria vinha sendo debatida há anos no âmbito judicial e que houve a pacificação do entendimento jurisprudencial pela 1ª Seção do STJ, em sede dos Embargos de Divergência n° 1.517.492/PR.

Naquela ocasião, a Corte Cidadã firmou precedente obrigatório sobre o tema determinando que a União não deve tributar os créditos presumidos concedidos pelos Estados e Distrito Federal em IRPJ e CSLL, independentemente de qualquer requisito ou classificação, por ocasionar latente violação ao Princípio Federativo.

A decisão do STJ baseia-se, sobretudo, na impossibilidade de a União retirar, por via oblíqua, o incentivo fiscal que o Estado-membro, no exercício de sua competência tributária, outorgou.

Acrescenta-se, oportunamente, que a jurisprudência dos Tribunais Regionais Federais[3] é pacífica em reconhecer a não incidência dos tributos federais citados sobre os valores dos créditos presumidos de ICMS, nos termos fixados no precedente obrigatório proferido pelo Superior Tribunal de Justiça.

Importante apontar, nessa altura, que, da leitura do inteiro teor do referido acórdão paradigma, pode-se concluir que não só os créditos presumidos podem ser excluídos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, mas qualquer benefício fiscal ou financeiro fiscal relativo ao ICMS previsto no Convênio CONFAZ n. 190/2017.

Nisso se inserem, por certo, as isenções, reduções de base de cálculo, manutenções de crédito, ou qualquer outra norma que proceda a recortes na regra geral de incidência do ICMS.

Exemplo disso, é que o Tribunal Regional Federal da 3ª Região – TRF3 tem aplicado a orientação do STJ mesmo em casos em que se discute benefício fiscal distinto do crédito presumido, a exemplo do acórdão proferido no Processo nº 5011390-26.2019.4.03.6100[4], em que se afastou a tributação federal sobre redução de base de cálculo de ICMS.

Aliás, imprescindível destacar o julgamento memorável proferido em acórdão publicado no último dia 16 de março, no qual a Primeira Turma do Egrégio Superior Tribunal de Justiça[5] decidiu que é ilegal a cobrança de IRPJ e CSLL sobre valores obtidos por empresa beneficiada por diferimento do pagamento de ICMS, concedido como incentivo fiscal.

Na oportunidade, o colegiado, por unanimidade, entendeu que o fisco, ao considerar esses ganhos como lucro, possibilita que a União retire, indiretamente, o incentivo fiscal concedido pelos estados, o que levaria ao esvaziamento ou à redução do benefício.

Releva notar ainda, que a 1ª Seção do STJ já se pronunciou sobre a exclusão dos valores subvencionados da base de cálculo dos impostos em destaque à luz da LC 160/17, reafirmando a impossibilidade de tributação federal dos incentivos estaduais e afirmou, in litteris:

[…] a superveniência de lei que determina a qualificação do incentivo fiscal estadual como subvenção de investimentos não tem o condão de alterar a conclusão de que a tributação federal do crédito presumido de ICMS representa violação do princípio federativo” (STJ, AgInt nos EREsp 1.462.237/SC, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 21/03/2019).

Ademais, não se pode deixar de mencionar que os entendimentos detalhados, nas informações acima, são aplicáveis, de igual maneira, às empresas que tributam o IRPJ e a CSLL pelo regime do Lucro Presumido, sob pena de ofensa aos preceitos constitucionais, sobretudo o princípio federativo, conforme jurisprudência do STJ[6].

Sobre as formas de reduzir a tributação do IRPJ/CSLL no tocante às subvenções

Conclui- se, diante de todas as considerações tecidas acerca do tema, que, para utilizar-se da isenção tributária instituída pela LC 160/17, é necessário que os lançamentos contábeis e fiscais tenham sido realizados corretamente e as obrigações acessórias tenham sido adequadamente cumpridas, ou seja, que os requisitos estabelecidos pela legislação, dentre eles o da não distribuição de lucros oriundos dos benefícios fiscais de ICMS, tenham sido satisfeitos.

De outro modo, enfatiza-se a possibilidade de se requerer judicialmente a não incidência de IRPJ e CSLL nas subvenções estaduais e distritais, independentemente da classificação da subvenção, de qualquer outro requisito e do regime de tributação, tendo em vista o Princípio Federativo, o que possibilita, inclusive, a restituição dos valores recolhidos indevidamente nos últimos cinco anos anteriores ao ajuizamento da demanda.

No final, ambas as formas possibilitam a diminuição do impacto tributário do IRPJ e da CSLL nas finanças das empresas. A adoção da estratégia adequada, entretanto, depende de uma análise casuística, a fim de que sejam assegurados os direitos da sociedade empresária.


[1]§ 4º  Os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao imposto previsto no inciso II do caput do art. 155 da Constituição Federal, concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal, são considerados subvenções para investimento, vedada a exigência de outros requisitos ou condições não previstos neste artigo.

5º O disposto no § 4º deste artigo aplica-se inclusive aos processos administrativos e judiciais ainda não definitivamente julgados.

[2] CARF, Acórdão 9101-005.508, julg. 13/07/2021

[3] i). AC 1003703-36.2018.4.01.3100, DESEMBARGADOR FEDERAL NOVÉLY VILANOVA, TRF1 - OITAVA TURMA, PJe 26/08/2021 PAG.

ii). TRF4 5010373-42.2018.4.04.7205, VICE-PRESIDÊNCIA, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 23/03/2022

iii). AC 08021762520214058400, DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS DE MENDONÇA CANUTO NETO, 4ª TURMA,TRF5 - JULGAMENTO: 22/03/2022

[4] (...) A lide tem por objeto a incidência do PIS/COFINS e do IRPJ/CSLL apurado pelo lucro real sobre valores oriundos de benefício fiscal instituído pelo Estado do Espírito Santo, permitindo ao contribuinte do ICMS: diferir o lançamento e pagamento do imposto; reduzir a sua base de cálculo; e estornar parcialmente os débitos (Lei 10.550/16). (...) Como acentuado em sentença, o entendimento é perfeitamente aplicável para o caso, resultante os valores também de benefício fiscal estadual voltado para fomentar investimentos em seu território. A LC 160/17, regulamentando a instituição dos benefícios fiscais concedidos pelos Estados no âmbito do ICMS, inclui os §§ 4º e 5º ao art. 30 da Lei 12.973/14. (...) Ocorre que, na forma da própria jurisprudência do STJ, a novel fundamentação não abala o fundamento de vulneração ao princípio federativo, refutando-se, consequentemente, a imposição de condições para a exclusão dos valores oriundos de benefício fiscal estadual das bases de cálculo do PIS/COFINS e do IRPJ/CSLL.

[5] REsp 1222547/RS, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 08/03/2022, DJe 16/03/2022.

[6] AgInt no REsp 1.781.738/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBEL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/03/2019, DJe 28/03/2019.