Coisa julgada e STF: os impactos do novo posicionamento da Corte

O Supremo Tribunal Federal passou a permitir, por unanimidade, a quebra automática da coisa julgada nas relações jurídicas tributárias de trato sucessivo a partir da mudança de entendimento da corte através do controle concentrado de constitucionalidade ou sob o regime de repercussão geral

Por Pedro Augusto — , 25 de February de 2023
Em: STF

O julgamento era muito aguardado, uma vez que lhe competia definir se o Fisco poderia voltar a cobrar tributo, em caso de mudança no posicionamento do STF, de um contribuinte cuja decisão judicial favorável já havia transitado em julgado.

Fato é que se decidiu no sentido da quebra automática das decisões definitivas, podendo o tributo ser cobrado com a observância da irretroatividade e das anterioridades anual e nonagesimal, conforme o caso.

Em suma, diante de nova jurisprudência da corte que permite a cobrança de um tributo outrora declarado inconstitucional, este poderá ser cobrado a partir do próximo ano e, no mínimo, decorridos noventa dias da mencionada decisão. Outrossim, não se permitirá a cobrança retroativa, em respeito ao princípio da irretroatividade tributária.

Salienta-se que a alteração de entendimento da Corte a justificar a quebra automática da coisa julgada deve ser aquela proferida em controle concentrado de inconstitucionalidade, como no caso do julgamento de ações diretas de inconstitucionalidade, bem como nos casos de repercussão geral.

Dos impactos da decisão

No caso concreto, conforme noticiamos aqui, o contribuinte obteve decisão favorável, transitada em julgado em 1992, que reconheceu seu direito ao não recolhimento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), em razão da inconstitucionalidade formal da Lei 7.869/1998.

No ano de 2007, contudo, no julgamento da ADI 15, o STF declarou constitucional o mencionado tributo. Diante disso, a União defendia que a contribuição poderia ser lançada e cobrada automaticamente a partir do referido julgamento.

Desse modo, diante do resultado do julgamento em questão, empresas que desde os anos 1990 já haviam obtido decisões transitadas em julgado que lhe concediam o direito de não pagar o tributo serão atingidas pela validação da cobrança pelo STF em 2007, ou seja, o Fisco poderá cobrar o tributo que deveria ter sido pago desde a alteração do entendimento do STF, respeitadas as parcelas atingidas pela decadência. 

Ademais, tratando-se de decisão proferida em sede de repercussão geral, deve valer para outros casos tributários.

Do respeito às anterioridades e à irretroatividade

É importante reforçar, no que diz respeito aos princípios tão caros ao Direito Tributário, que a cobrança dos tributos que deixaram de ser recolhidos em desacordo com nova decisão jamais poderá retroagir.

Em outras palavras, o contribuinte que deixou de recolher o tributo com fundamento em decisão judicial transitada em julgado conforme o entendimento favorável que se tinha à época da decisão não terá que recolher o que deixou de pagar no período em que o entendimento do STF lhe era favorável e que, posteriormente, deixou de ser. Deveras, apenas após a nova decisão que decide pela constitucionalidade do tributo, respeitadas as anterioridades anual e nonagesimal, é que deverá voltar a pagar o tributo.

Vejamos o que disse o STF, ipsis litteris:

  1. Já as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral interrompem automaticamente os efeitos temporais das decisões transitadas em julgado nas referidas relações, respeitadas a irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal, conforme a natureza do tributo.

Da movimentação do Poder Legislativo

Diante desse julgamento, quatro projetos de lei já tramitam no Congresso Nacional visando minorar os impactos dessa decisão. São eles o PL 580/23, PL 508/23, PLP 26/23 e o PL 512/23.

O mais recente deles, PL 580/23, tem como proposta a exigência de ação rescisória para que o tributo possa ser exigido, afastando-se a possibilidade de quebra automática da coisa julgada.

O PL 508/23, por sua vez, mantém, até 10 de fevereiro, os efeitos de decisões transitadas em julgado.

Por fim, os dois últimos projetos de lei versam sobre medidas facilitadoras para o pagamento de débitos tributários oriundos da nova jurisprudência do STF, criando uma transação tributária excepcional (PLP 26/23) e um Programa Especial de Regularização Tributária do Fim da Coisa Julgada (PERT-FIM).