Rebaixa de preços e impactos na tributação de PIS/COFINS

Aspectos contábeis e tributários a serem observados pelo adquirente varejista no tratamento das vantagens obtidas em acordos comerciais

Por Deborah Mendes — , 25 de January de 2022
Em: PIS/COFINS

A dificuldade de manutenção de uma empresa com sucesso no Brasil não é segredo para ninguém. Com isso em vista, acordos comerciais são firmados com o intuito de alcançar melhores condições para o desenvolvimento das atividades empresariais das partes envolvidas.

Nesse contexto, a rebaixa de preços aparece como prática recorrente no cotidiano das empresas que consiste, basicamente, em vantagens obtidas em acordos estabelecidos entre os adquirentes e os fornecedores na compra de mercadorias.

Os resultados são positivos para os dois lados. Para o adquirente, tais vantagens ou bonificações podem se materializar na forma de descontos nas faturas a pagar, recebimento de mercadorias bonificadas ou, até mesmo, de crédito em conta.

Já para o fornecedor, o acordo pode resultar em elevação dos níveis de produção e venda, com obtenção de lucro no volume comercializado, fidelização de clientes, dentre outros.

Mas o cenário não é tão simples como parece. Ao contrário, existem infindáveis regras contábeis e tributárias que devem ser observadas no tratamento das vantagens obtidas com a rebaixa de preços. A análise e classificação cautelosa é necessária para dar segurança jurídica ao negócio e evitar que, o que era uma vantagem, se torne uma desvantagem após a tributação.

Para tomar a decisão acertada, é preciso conhecer o cenário jurídico que envolve o tema, o qual, já adiantamos, não é simples. Como de costume no Direito, os entendimentos são diversos e há posicionamento tanto a favor do contribuinte quanto contra. Tudo vai depender da forma que o acordo foi feito e de como as vantagens e bonificações serão tratadas.

Na tentativa de elucidar as nuances discutidas acerca do tema, o primeiro passo nos leva a estudar a natureza jurídica das vantagens obtidas com a prática da rebaixa de preços. Calha mencionar, aqui, que por natureza jurídica se entende o conceito que se propõe a explicar determinado instituto jurídico em sua essência.

Da análise da jurisprudência administrativa, há posicionamentos no sentido de que a rebaixa de preços pode ser entendida como espécie de bonificação caracterizada pela “concessão de vantagens dadas pelo vendedor ao comprador”, constituindo espécie de desconto.

Sendo espécie de desconto, há de se observar o tratamento contábil destinado a tal parcela, nos termos estabelecidos pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis. Para o adquirente, os descontos comerciais e os abatimentos devem ser deduzidos do custo de aquisição dos estoques.[1]  Já para o fornecedor das mercadorias, o valor dos descontos ou bonificações concedidos deve ser deduzido da receita auferida com a venda.[2]

Partindo do pressuposto da natureza jurídica de desconto das vantagens provenientes da rebaixa, a pergunta que se faz é: qual o tratamento tributário dispensado a elas?

Pois bem, tratando-se de PIS e COFINS, sabe-se que a grandeza por elas tributável é, basicamente, a receita auferida pela pessoa jurídica na venda de bens e serviços.[3]

Ora, se as vantagens oriundas da rebaixa de preço são descontos obtidos na aquisição das mercadorias, o que não constitui ingresso de novos recursos no caixa da empresa, parece claro que não devem ser tributadas em PIS e COFINS.

É certo que “obter desconto na aquisição de um produto” (rebaixa de preço) é o oposto imediato de “auferir receita com a venda de uma mercadoria” (fato gerador do PIS e da COFINS). Não há como interpretar as normas legais pertinentes com razoabilidade e, ainda assim, dizer que as vantagens alcançadas configuram base econômica tributável das referidas contribuições.

Logo, não se subsumindo ao conceito de receita, mas sim de descontos, as vantagens e bonificações da rebaixa de preços devem ser excluídas da receita da empresa como redutores de custo ou estoque.

Entretanto, a despeito da logicidade dos aspectos mencionados, não é essa interpretação da Receita Federal sobre o tema, haja vista o entendimento[4] de que tais bonificações e vantagens revelam intuito de lucro e habitualidade e, por isso, devem ser tributadas em PIS[5] e COFINS[6], posto que configurariam receita do adquirente das mercadorias, nos termos previstos nas leis n. 10.637/02 e 10.833/03. Cumpre ressaltar, ainda, que a RFB também não classifica tais importâncias como Receitas Financeiras, nos termos da Solução de Consulta 380/2017.

No CARF[7], por sua vez, o assunto não está pacificado. Alguns julgados defendem que tais bonificações possuem natureza de receita, nos termos previstos na legislação, o que legitimaria a tributação.

Nessa discussão entram aspectos do próprio acordo particular firmado entre as partes, pois há quem diga que eles são, na prática, espécie de “pedágio” cobrado pelas empresas adquirentes para que os fornecedores tenham seus produtos comercializados em determinado estabelecimento, o que importaria na classificação das parcelas para fins de tributação.

Por outro lado, há decisões que tratam as bonificações e vantagens como parcelas redutoras de estoque ou custos, de modo que não se enquadrariam na base econômica tributável das contribuições em comento.

A situação está longe de se tornar pacífica e ainda há muito a se discutir. Enquanto isso, o caminho mais seguro para o contribuinte é a análise do caso concreto por um profissional do direito, para que se obtenha o auxílio necessário à busca da tutela jurisdicional, a fim de garantir o direito de não tributar as vantagens oriundas da rebaixa de preços, restituir ou compensar eventuais créditos existentes no período prescricional e, por fim, evitar autuações fiscais indesejadas.


[1] Item 11 do CPC, aprovado pela Deliberação CVM n. 575/2009: “O custo de aquisição dos estoques compreende o preço de compra, os impostos de importação e outros tributos, bem como os custos de transporte, seguro, manuseio e outros diretamente atribuíveis à aquisição de produtos acabados, materiais e serviços. Descontos comerciais, abatimentos e outros itens semelhantes são deduzidos na determinação do custo de aquisição.”

[2] Pronunciamento técnico CPC n. 30, item 10: “O montante da receita proveniente de uma transação é geralmente acordado entre a entidade e o comprador ou usuário do ativo e é mensurado pelo valor justo da contraprestação recebida, deduzida de quaisquer descontos comerciais e/ou bonificações concedidos pela entidade ao comprador.”

[3] Art. 1º das Leis n. 10.637/2002 e 10.833/2003.

[4] Posicionamento consolidado através da Solução de Consulta Cosit n. 380/2017.

[5] Programa de Integração Social.

[6] Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social.

[7] Conselho Administrativo de Recursos Fiscais.