MP 1.160/2023: como a volta do voto de qualidade e o aumento do valor de alçada para os recursos afeta o contribuinte

Contribuintes temem incertezas com a alteração no critério de desempate nos julgamentos administrativos do órgão e elevação do valor mínimo de alçada para o seu acesso

Por Pedro Augusto — , 03 de February de 2023
Em: CARF

Voto de qualidade

O pacote de medidas econômicas apresentado pelo Ministério da Fazenda em 12 de janeiro deste ano gerou muita discussão, trazendo como uma das medidas a volta do voto de qualidade ao Conselho Administrativo de Recursos Federais (o CARF).

A Medida Provisória altera o disposto na legislação que, desde 2020, determinava que, em casos de empate nos julgamentos de processos administrativos federais, a decisão fosse favorável ao contribuinte.

Com a mudança, volta o antigo voto de qualidade, que garante o poder do voto de desempate ao presidente do colegiado, ou seja, aos conselheiros representantes da Fazenda Nacional.

Deste modo, sendo o voto de qualidade proferido por parte do Fisco, há grande apreensão com a possibilidade de ser empregado um cenário desfavorável ao contribuinte nos casos de empate.

O restabelecimento do voto de qualidade no órgão vai em desencontro com a formação de uma maioria no Supremo Tribunal Federal (STF) pela constitucionalidade da lei que dava ganho ao contribuinte nos casos de empate nos julgamentos.

Isso, porque o tema é objeto das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs 6399, 6403 e 6415) no STF, que questionam o fim do voto de qualidade que ocorreu em 2020, que, apesar de não ter tido seu julgamento concluído, já conta com a formação de uma maioria para declarar constitucional o artigo 19-E da Lei 10.522/2002, responsável pela abolição do voto de desempate pelos representantes do Fisco.

Aumento do valor de alçada

Também há grande apreensão por parte do contribuinte com relação ao aumento da alçada para acesso ao CARF, de sessenta para mil salários-mínimos, sujeitando o contribuinte a recorrer ao Poder Judiciário em busca de um julgamento imparcial, arcando com as despesas e riscos decorrentes de um processo judicial.

Com a mudança, processos com o valor inferior ao novo limite serão julgados definitivamente pelas Delegacias de Julgamento da Receita Federal, ignorando o fato de que as causas de menor valor são justamente a dos menores contribuintes, o que acaba por ferir os seus direitos constitucionais à ampla defesa e ao contraditório.

Repercussão

A parcialidade que o contribuinte volta a enfrentar no CARF, além de ir contra o princípio do in dubio pro contribuinte, o sujeitará a arrastar as discussões ao Poder Judiciário em busca da segurança jurídica outrora garantida pelo órgão paritário.

Ainda neste sentido, o contribuinte enfrentará maior morosidade decorrente do aumento dos litígios e arcará com maiores gastos no Poder Judiciário, como consequência da elevação do valor mínimo de alçada para acesso ao órgão administrativo, realizada com o intuito de aumentar a arrecadação tributária.

Nos resta agora acompanhar a convalidação ou não da mencionada MP 1.160/2023 pelo Congresso Nacional, que tem até 120 dias de sua publicação para apreciá-la.

Releva notar que o Senado Federal está promovendo uma consulta pública sobre o retorno do voto de qualidade[1]. Você, contribuinte, não deixe de participar!


[1] https://www12.senado.leg.br/ecidadania/visualizacaomateria?id=155690